O 'dom de línguas' - ou glossolalia - muito em voga nas igrejas pentecostais e na renovação carismática católica pode, se quisermos encará-lo numa perspectiva científica, estar de acordo com a trilogia da semiótica peirceana, com a filosofia heideggeriana da linguagem e especialmente com a noção genésica do poder intuitivamente criativo da fala. Esta 'linguagem dos afectos' muito comum durante as relações de bom sexo ou numa relação de intimidade mãe-filho - especialmente visível nos mamíferos - pode nesta perspectiva indiciar alguns elementos fundamentais da natureza espontânea da comunicação. Se quisermos ser ainda mais rigorosos podemos inclusivamente constatar que esta experiência não se limita ao âmbito da espiritualidade cristã mas também está presente em muitas situações validadas cientificamente como um fenómeno capaz de estabelecer um relacionamento prático entre a imanência e a transcendência, entre o natural e o sobrenatural, entre o divino e o humano. O 'dom de línguas' pode também ser um “sinal escatológico” de que a fé (ou as fés) deve(m) ser encarada(s) numa perspectiva menos acrítica e naturalmente mais racional e consequentemente mais científica.
Manuel Adriano Rodrigues
09/02/16